FUTEBOL: ARTE E CIÊNCIA O CONCURSO DE BOLEIRO COISAS QUE SÓ ACONTECEM NO BOTAFOGO - SóEsporte
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FUTEBOL: ARTE E CIÊNCIA O CONCURSO DE BOLEIRO COISAS QUE SÓ ACONTECEM NO BOTAFOGO

Em El Salvador estavam previstos dois jogos. Um contra uma seleção local e outro contra o Independente da Argentina.

Estava nos esperando no aeroporto o embaixador brasileiro Lauro Muller, que foi entusiasticamente saudado pela turma. Era conhecido de todos os jogadores do Botafogo, exceto dois ou três que não tinham participado da excursão à Europa em 1956. Ou melhor, do jogo contra o Barcelona. Lauro Muller era, então, nosso cônsul na cidade espanhola e como gosta muito de futebol foi assistir ao jogo. Claro, não poderia faltar. Além do mais tinha sido nos tempos de rapaz, defensor das cores alvinegras.

João Citro nega esta cena até hoje, mas foi encanado mesmo. Estava na arquibancada e, quando viu o time do Botafogo preso, foi até o distrito policial e declarou-se chefe da delegação. Os homens mandaram Citro entrar e fecharam a porta por trás dele.

Garrincha observou: O senhor também está na galera, olha lá: eles fecharam a porta.

Citro resmungou: Preso nada. Estou aqui para tirar vocês.

Então saia, seu Citro. Vá ali à porta e diga ao guarda que o senhor quer ir embora para casa. Vê se eles deixam – provocou Garrincha.

Citro ficou meio indeciso, chegou a dirigir-se à porta, mas, pensando melhor, respondeu à Garrincha:

– Não saio porque não quero sair sozinho. Eu vim aqui para sair com vocês.

– Então acho bom o senhor mandar buscar uns cigarros e sanduíches. Dá uma grana aí ao guarda que ele traz. Aqui só tem água. Pelo jeito isto é cana pra dois ou três dias.

Citro ficou meio desapontado, mas não pediu nada ao guarda. Isto seria admitir que estava mesmo preso e não ficaria bem.

O negócio estava na base da gozação, quando chegou uma ordem para que todos fossem para o xadrez. Até aquele inste a prisão era uma sala grande nos fundos da delegacia. E todos incluía João Citro.

Ouviu-se um barulho lá fora e alguém, em português, dizendo:

– Não permitirei de forma alguma que um clube de meu país seja colocado num cárcere! Esta prisão já é uma ofensa. Dentro de um cárcere não permito! Isto é um desrespeito e uma inamistosidade.

Era o então cônsul brasileiro, Lauro Muller, que, energicamente protestava.

Mas o oficial espanhol respondeu:

– Não há nada a fazer, eles vão para o cárcere. Não há remédio.

Lauro Muller abriu a porta, entrou na sala dos detentos e disse:

– Pois então eu também estou preso e vou junto com eles para o cárcere, e o senhor vai ser responsável por isto.

O oficial quis explicar alguma coisa, mas Lauro Muller, que já estava queimado, entrou de sola:

– Não quero mais perder tempo com o senhor. Desejo apenas entrar em contato com nossa Embaixada em Madri.

O diabo é que era domingo. E num domingo é difícil encontrar as pessoas. Em todo caso, o ambiente melhorou muito. Deixaram vir sanduíches e refrigerantes, e o tratamento foi cordial. O pagamento de uma multa por cabeça resolveu o assunto. Apenas Amauri ficou mais tempo porque, com um soco, tinha destroçado o queixo do massagista do Barcelona. A multa de Amauri foi em dobro. O gozado é que quem deu o tal soco foi o Pereira Natero, goleiro reserva, que com o mesmo uniforme, deu a impressão de ser o goleiro efetivo.

O cônsul brasileiro em Barcelona só saiu quando Amauri foi solto. Tudo isso veio à baila quando, inesperadamente, o encontramos como Embaixador em El Salvador, dois anos depois.

De fato, o time da casa era fraquíssimo. O goleiro era um argentino que tinha resolvido fazer uma excursão a Buenos Aires-Nova Iorque de bicicleta. Mas, como o dinheiro tinha acabado, resolveu ficar por ali mesmo. E como precisava se virar em alguma coisa, disse que era jogador de futebol e arranjou lugar no time. Veio o segundo tempo e demos uma enfiada de gols. Quando ficou cinco a um, nosso time, para ir a forra, resolveu não deixar mais que eles pegassem na bola e deu baile.

De fato, passaram-se uns dez minutos sem que eles tocassem na bola. De repente o alto falante começou: Senhor árbitro! Senhor árbitro! Não permita isso. São uns palhaços. Termine a partida. Termine a partida. Quem está falando é o chefe de polícia! A bola ia e vinha e o adversário que não queria servir de trouxa ficou quase parado. O alto falante anunciou oito no time brasileiro substituindo os que estavam dando o baile.

O jogo do Independência seria três dias depois.

Garrincha sumiu. Mané Garrincha foi encontrado num cabaré dançando. Mané ria sem parar e caiu fora as carreiras. A garota me convidou para o concurso de Boleiro, fui representar o Brasil. O Botafogo vai multar Garrincha em 20 dólares e Garrincha disse: vocês do Botafogo é que vão me pagar 20 dólares, porque perdi porque eu ia ganhar o concurso de dança.

 

Eduardo Pimentel

Técnico de Futebol

 

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