Para que os jogadores procedam com lealdade e honestidade no futebol, se faz necessário que os dirigentes sejam também honestos e leais.
O dirigente terá que ter uma formação de escol, para a elevação nobre do futebol. Os medíocres e vaidosos praticantes de manobras escusas arrastarão o esporte às profundezas da imoralidade.
Ao nos referirmos a dirigentes, englobamos todos aqueles que concorrem para a formação integral do esportista, ou seja, diretores, orientador esportivo, o professor de educação física e esportiva, o orientador técnico ou tático, médicos, psicólogos, enfermeiros, supervisor e massagistas.
Aos diretores cumpre dirigir a massa praticante e a espectadora, porque se não o fizer será por elas dirigido. Eles servem a uma grande causa; “não basta, na vida, pensar num ideal; é preciso aplicar todo esforço no sentido de sua realização”.
Nas mãos do diretor se deposita o futuro do futebol de uma equipe. É dele que depende a solução pública dos vários problemas que envolvem os jogadores, para que as massas compreendam, ajudem e edifiquem uma equipe cada vez mais forte e sólida. O diretor de escol é caracterizado pela sua cultura, preparação intelectual, técnica e filosófica, agindo com justiça para com todos, indistintamente; deverá agir com bondade, mas no momento certo, de acordo com o merecimento; estar atento para não cometer injustiças, protecionismo e impunidade. Só assim a equipe não será envolvida pela imoralidade. Não concebemos o futebol sem moral. Ao supervisor técnico ou ao orientador esportivo cabe estar presente a todas as atividades da equipe para melhor conhecer seus atletas. É ele o responsável direto pela sublimação do futebol e a conscientização disciplinar de seus comandados.
Além de supervisionar os trabalhos de seus auxiliares, deve orientar os jogadores quanto a conduta dentro e fora do campo; quanto aos hábitos socialmente valorizados, quanto aos estudos escolares, quanto ao comportamento cívico, atitudes de respeito, lealdade, polidez e cavalheirismo; estimular o comportamento liberal permitindo à livre crítica, exposição de ideias, aos bons exemplos, a amizade sincera e ao desenvolvimento da afetividade esportiva.
Tudo está na dependência das atitudes dele próprio: atitude moral, psicológica e esportiva; atitudes responsáveis com amadurecimento mental; falar pouco dando mais exemplos; dirigir em vez de transigir; a parcialidade pela justiça e o empirismo pela competência. Antes de supervisor ele é um educador de homens ou futuros homens e deve fazê-lo sem paternalismo para com alguns e tapinhas nas costas para com outros; corrigir os erros sem arrogância, ou prepotência sobre os mais humildes, a equipe deve ser uma unidade: todos são iguais perante o supervisor.
Ele não deve orientar sua equipe somente para alcançar vitórias. Deve orientar primeiro a formação do homem digno e disciplinado, saudável de corpo e espírito, capaz de viver e trabalhar em equipe, dentro dos salutares princípios da ética. E, para tanto, além dos conhecimentos técnicos e científicos do futebol, o supervisor precisa ter perfeita consciência da psicologia futebolística e dos conceitos de agonística, motivação e emoção, bem como da personalidade do atleta.
Aos professores, treinadores, médicos e massagistas, cabe uma grande parcela de responsabilidade na educação moral; são eles que mantém o contato mais íntimo com os atletas e devem corrigir o erro, o mal, as imperfeições da alma.
Estes elementos devem ser antes, os protótipos da educação e da ética esportiva. Cada um deve ser competente no sentido moral, para o papel que desempenha junto “a equipe”. Como bons profissionais todos os esportes podem servir a causa da educação. Mas com professores medíocres não há esporte bom e útil – afirma M. G. Viana. De nada vale mudar os programas; devem ser mudados os programadores e os executantes.
Porém, não basta ao staff técnico ser capacitado sob o ponto de vista científico. É imprescindível que cada um conheça a escala de valores dos princípios éticos esportivos, além da conceituação filosófica do futebol. É necessário que pensem com suas cabeças, unam as forças positivas e não partilhem e nem se ajustem a hipocrisia moral, alheia. Uma equipe não pode tornar-se um grosso rebanho social. É preciso que se saiba o alcance destes trabalhos, suas consequências às vezes transcendentes do menor deslize ou lapso.
Não poderíamos deixar de anotar aqui o que acentua Inginieros: o homem é um valor social, e produto de dois fatores: hereditariedade e educação. Neste segundo fator reside toda a responsabilidade daqueles que orientam, preparam, cuidam e tratam de uma equipe em formação.
A criança se desenvolve como o animal da espécie humana, afirma Inginieros, até começar a distinguir as coisas inúteis dos seres vivos e a reconhecer, entre estes, os seus semelhantes. Os princípios de sua educação são dirigidos pelas pessoas que o circundam, tornando-se cada vez mais decisiva a influência do meio; desde que este domine, a criança evolui como um membro de sua sociedade, e seus hábitos se organizam mediante a imitação, sendo o homem mais tarde, caracterizado como uma pessoa diferente dentro da sociedade.
Os exemplos e as imitações desempenham um papel importantíssimo na formação da personalidade do indivíduo que passará a aperfeiçoar o que aprendeu.
Vejamos então, os dois extremos a que poderão chegar os indivíduos em formação: se seus mestres, através de lições exemplares, fixarem-lhes os reflexos de ordem, higiene, respeito, linguagem decente, correção de atitudes e nobreza de ideias, aqueles indivíduos irão, sem sombra de dúvida, aperfeiçoar estas qualidades através da sua imaginação, criando novos valores socialmente dignos, e, em termos de futebol, seria a sublimação do esporte.
Por outro lado, se a moral for apenas uma palavra inerte dentro dos dicionários e aqueles que deverão dar a ela um dinamismo, são incompetentes, apesar da boa vontade, os indivíduos carentes de orientação ética irão adquirir os reflexos de desordem, desrespeito, linguagem obscena, condutas inconvenientes e mediocridade de ideias. Ora, estes também agirão da mesma maneira que os primeiros: aperfeiçoarão a imoralidade regredindo para a delinquência e descendo até a negra marginalização, o extremo degradante da sociedade, e a decapitação do futebol.
Estaria o nosso esporte situado num destes extremos? Felizmente ou infelizmente, nos dois.
Há aqueles que imitaram os bons exemplos: tiveram a felicidade de cair nas mãos de verdadeiros escóis, são por excelência, homens na acepção nobre do termo; vivem em harmonia com o grupo, com a equipe, pensando e agindo com sua própria cabeça, convictos de que estão certos, e estão.
Existe também aquele que não foi feliz, e seu mestre não foi, na verdade, um mestre, foi um demonstrador de maus exemplos, pela incorreção de suas atitudes. Infelizmente este atleta foi um objeto de barro manipulado por mãos grosseiras e irresponsáveis; ele vive em desarmonia, formando grupelhos, usando de manobras escusas; não é respeitado porque não sabe respeitar; não age com a própria cabeça porque não sabe quando está certo ou errado, deixando que os instintos animais guiem-lhe os passos. É um infeliz e seu futuro será o esquecimento, o abandono e a miséria.
A par do que expomos, o Dr. Alexis Carrel salienta que a saúde é um problema de equilíbrio das funções orgânicas, e, portanto, se o exercício físico não estiver libertado de malquerenças, deslealdade, inveja, ódio e agitação íntima, não existirá a indispensável harmonia de funções. Daí a atitude sempre vigilante do treinador, professor, médico ou psicólogo sob o ponto de vista moral.
No conceito moderno de agonística, o adversário não é um inimigo, ele é um colaborador, um fiscal e mestre, principalmente quando atua melhor e nos possibilita aprender algo mais, contribuindo para a elevação digna do futebol.
Para concluir, gostaríamos de anexar uma ficha de conduta do atleta, onde após alguns anos de pesquisas, selecionamos alguns adjetivos morais indispensáveis ao jogador de futebol.
Outros itens podem e devem ser acrescentados, desde que os julguem necessários; outros poderão ser suprimidos caso sejam eles desnecessários.
Centenas foram os atletas que se submeteram a nossa pesquisa desde 1966, quando éramos responsáveis pela equipe de natação do Clube de Regatas Flamengo do Rio de Janeiro até 1972 e no Sport Club Corinthians Paulista, aí já na qualidade de preparador físico do departamento de futebol profissional. Há de se salientar, também, a equipe de natação da Hebraica de São Paulo onde tivemos o privilégio de desempenhar nossas atividades.
Eduardo Pimentel
Técnico de Futebol