FUTEBOL: ARTE E CIÊNCIA - 1982 TELÊ X ROSSI - SóEsporte
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FUTEBOL: ARTE E CIÊNCIA – 1982 TELÊ X ROSSI

Telê Santana montou na Copa do Mundo de 1982 o que o torcedor convencionou chamar de “a última grande seleção brasileira da história”. O time fez de fato exibições de encher os olhos. Mas Telê também cometeu pecados que raras vezes são apontados pelos críticos. Foi a maneira que a maioria esmagadora encontrou para perpetuar o futebol-espetáculo que tombou definitivamente diante do pragmatismo da Itália de Enzo Bearzot da Espanha.

Telê contrariou o Brasil inteiro ao manter Waldir Peres como goleiro e Serginho como centroavante. Rejeitou todas as propostas para jogar com dois pontas abertos. E insistiu com o zagueiro Luisinho, um jogador de muitos recursos, mas que se revelou um desastre logo na estreia, contra a URSS, concedendo espaços demasiados aos adversários e cometendo pelo menos dois pênaltis escandalosos. No primeiro, puxou Shengelia pela camisa no momento da conclusão; no segundo, desviou com a mão um cruzamento que encontraria Blokhin de frente para o crime. O juiz espanhol Llamo Castillo fez que não viu. Não bastasse o frango monumental! engolido por Waldir Peres, prova de que o goleiro não inspirava confiança, e as oportunidades totalmente desperdiçadas por Serginho, a seleção entrou em campo para a estreia ostentando a inexplicável escalação de Dirceu na ponta direita. Segundo Telê, sua função seria marcar o ponta Blokhim, que de ponta tinha pouco – principal jogador do time, atuava recuado como terceiro homem de meio campo. Menos mal que o equívoco foi corrigido no intervalo, com a saída de Dirceu e a entrada de Paulo Isidoro, que tornou a equipe mais coesa, com forças para virar o placar para 2 a 1.

Os erros praticamente desapareceram diante da fragilidade de Escócia e de Nova Zelândia, que o Brasil goleou respectivamente por 4 a 1 e 4 a 0. A Seleção também não teve dificuldades em vencer a Argentina por 3 a 1. Mas a vitória, com exibição deslumbrante, a melhor da copa, inesquecível balé de bola, incorporou novos elementos. O excesso de confiança e o complexo de superioridade, explorado com habilidade pela crônica europeia e por Bearzot, uma velha raposa do futebol. Ora, os brasileiros foram perfeitos, taticamente fizeram uma partida sem erros, souberam explorar as falhas dos adversários, e mais do que isso, ocupar todos os espaços do campo, com um jogo objetivo e de conjunto. “Estou encantado” disparou.

As vitórias e os elogios deixaram Telê definitivamente convencido de que não precisava mexer no time. Eis que veio o jogo com a Itália. Bearzot recuou sua equipe, pôs Gentile e Tardelli para bater nas canelas dos brasileiros, e deixou que Paolo Rossi, II Bambino d’oro, se aproveitasse do espaço que Luizinho, marcando à distância, lhe concedia. Vibrou com os incríveis passes equivocados de Toninho Cerezo, que definitivamente não estavam em suas previsões. Quando Falcão estabeleceu o 2 a 2, restavam vinte minutos. Um pequeno crédito a Telê: ele sacou Serginho e pôs Paulo Isidoro. A ideia era fechar o meio, pois o empate classificava o Brasil. Não surtiu efeito. Rossi fez 3 a 2. Patética a imagem de Junior, braço levantado, exigindo a marcação de impedimento, quando ele próprio dava condição de jogo. Outra lembrança: Antognioni fez 4 a 2, e o juiz, israelense Abraham Klein anulou o gol absolutamente legal.

A lavagem de roupa suja foi no próprio vestiário. Está nos jornais do dia seguinte. Leandro lamentou a falta de um ponta direita que o ajudasse a construir as jogadas pelo setor. Quem há de esquecer o bordão “bota ponta, Telê”, que Jô Soares repetia em seu programa de TV? Edinho disse que as falhas ocorreram “ali entre o Luizinho e o Junior”. Paulo Isidoro disse que foi injustiçado, obrigado a jogar fora de sua posição, no sacrifício, e barrado “na hora de comer o filé”. Serginho também garantiu que atuou fora de suas características. Zico disse que faltou “grito!” A seleção de 1982 não era tão perfeita assim. Tanto que Pacheco, o torcedor símbolo que a Gillete criou para a Copa, cortou os pulsos com o produto que anunciava, morrendo em seguida num hospital de Barcelona.

Eduardo Pimentel

Técnico de Futebol

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