FUTEBOL: ARTE E CIÊNCIA - CARLOS ALBERTO PARREIRA, EXPERIÊNCIA E COMPETÊNCIA I - SóEsporte
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FUTEBOL: ARTE E CIÊNCIA – CARLOS ALBERTO PARREIRA, EXPERIÊNCIA E COMPETÊNCIA I

FUTEBOL: ARTE E CIÊNCIA

CARLOS ALBERTO PARREIRA, EXPERIÊNCIA

E COMPETÊNCIA  I

Se você perguntar a qualquer pessoa bem sucedida se ela acredita que alguém seja capaz de realizar seus sonhos sem a ajuda de ninguém, certamente sua resposta será negativa. De algum modo, em algum momento, alguém lhe estendeu a mão. Um gesto que, às vezes, pode ser singelo, mas que, sem dúvida, fez toda a diferença.

Não foi diferente comigo. Além da minha disposição e do desejo de crescer profissionalmente tive em meu caminho muitas pessoas que me ajudaram e acreditaram em mim.

Carlos Alberto Parreira tem um grande mérito em sua trajetória de vida no futebol: ele se preparou para ter sucesso. Não se tornou técnico de repente. Começou a carreira como preparador físico, mas sempre observando atentamente todo o trabalho dos treinadores que o incomodavam. Foram 13 (vejam a sorte aí) anos como preparador físico, para então definitivamente assumir a nova função. A de treinador chegou simplesmente ao comando da Seleção Brasileira e foi campeão do mundo. Sem contar os mais de 15 anos fazendo trabalhos de ponta no exterior.

Parreira sempre sofreu algumas críticas sobre sua forma de armar um time: defensivista, pouco ousado, adjetivos do gênero. Um desses críticos plantou em minha cabeça a semente que se transformaria nesta obra. No dia 17 de julho de 1994, na sala de imprensa da Rose Bowl, em Pasadena, horas depois de o Brasil ter sido tetracampeão do mundo, desliguei o computador, pois já havia transmitido inúmeras matérias para o Jornal do Brasil. Fui, então, festejar o título, que ninguém é de ferro. Cruzei com um amigo jornalista de São Paulo, que se virou para mim e disse com a cara emburrada: Um título com a cara do Parreira. Nos pênaltis.

Foi como um soco em meu ouvido. A sensação de injustiça me bateu fundo e, a partir dali, achei que eu e a torcida brasileira devíamos um agradecimento a Parreira. Depois de muito trabalho na imprensa, o crescimento do filho, desencontros com o treinador viajante… demorou quase 12 anos, mas saiu!

Apesar das críticas, ele tem tanto a nos ensinar sobre “voltas por cima” que, recentemente, ao introduzir na seleção brasileira o quadrado mágico no meio-campo, com quatro jogadores ofensivos, acabou com os argumentos dos velhos críticos. Alguns deles, vejam a ironia, chegam agora a dizer que o Brasil está ofensivo demais…

Aos 23 anos, estava formado em Educação Física, com especialização em Técnico de Futebol, pela Escola Nacional de Educação Física e Desportos.

Por que fazer este livro?

Sempre ouvimos dizer que o homem, para marcar sua presença aqui pela terra, teria de ter um filho, plantar uma árvore e escrever um livro. Como já completei os dois primeiros desafios, faltava o último. Por que só agora, então? Percebi que, muito mais do que falar de futebol, todos estavam focados em saber como alguém como eu, que nunca atuou como jogador profissional, no chamado país do futebol, conseguiu dirigir a Seleção Brasileira em três oportunidades diferentes, comandá-la e mais de 120 jogos, participar de sete copas do mundo – quatro delas com a seleção brasileira – e conquistar dois títulos mundiais: um na Copa de 1970, como preparador físico e outro em 1994, como técnico. Sem dúvida, isso é uma conquista.

“O que as vitórias têm de mim é que elas não são definitivas. O que as derrotas têm de bom é que elas não são definitivas.”

“Eu estudava o sistema de jogo dos adversários com os slides que o Parreira produzia. Além disso, ele era mais do que um preparador físico, acabava sendo um auxiliar técnico, pois ia ver nossos rivais atuarem e depois me passava o que vira.”

O Gerson não teve culpa alguma nesse episódio. Ele procurou colaborar até onde pôde. Esse foi a grande lição para mim. Desde então, jogador que não faz um mais forte na véspera de um jogo não entra em campo mesmo. Eu iria viver a mesmíssima situação por muitas vezes em minha carreira, nos clubes e na seleção. Não dá para achar que um jogador sem condições de atuar no sábado à tarde vai tê-las 24 horas depois. Num caso assim, a gente pode até saber que o atleta não vai jogar e não divulgar para não facilitar as coisas para o adversário, ou para não esvaziar o interesse do público, não desmotivar a torcida.

O reencontro com o mestre e a terra dos mais de mil e uma noites.

No segundo semestre de 1975, Parreira continuava como preparador físico do Fluminense e estava em Belém com o time quando, em seu quarto do hotel, tocou o telefone. Era uma ligação de Recife. Do outro lado da linha estava o já velho amigo de duas copas, Zagallo.

Parreira, você quer vir trabalhar comigo no Kuwait?

Ontem.

Como é que é?

Ontem. Quando vamos?

A recordação faz Zagallo dar boas risadas diante da determinação de seu pupilo.

Ele foi taxativo. Nem me deixou terminar a frase.

Por intermédio do empresário Elias Zacour, Zagallo havia recebido o convite para dirigir a seleção do Kuwait e convidara Admildo Chirol. Mas este não quis se aventurar no mundo árabe naquele momento. Zagallo pensou, então, que o único nome inteiramente confiável para ir com ele era o de Parreira. Ao chegar no Kuwait, o Velho Lobo acertou o contrato, mas disse aos xeques que só aceitava se Parreira fosse incluído. Aceitaram. O curioso é que Parreira havia feito um pedido salarial e eu ainda consegui um valor bem maior para o salário dele, garante o mestre.

Zagallo acertou seu contrato com o alvinegro carioca. Quando foi a vez de Parreira, o Botafogo ofereceu 30% do salário de Zagallo. Parreira: “Eu não queria um salário igual ao dele, que já era um profissional consagrado. Aceitaria de bom grado receber metade do que ele recebia. Mas achei muito baixo e não aceitei”.

Todo grupo precisa de um líder no futebol, essa figura precisa existir dentro e fora de campo. Isso mantém a hierarquia bem estabelecida. A hierarquia precisa existir até mesmo em nossa casa. Lá é sempre a mulher quem manda. O líder de um grupo também precisa necessariamente detectar quem são outros líderes em potencial, para substituto numa eventualidade, ou representá-lo (no caso do futebol técnico não joga, mas é preciso que alguém tome decisões durante o jogo). Essa é uma tarefa que Parreira desempenha com grande talento por onde passa.

Na copa de 1994, por exemplo, Parreira tinha além do apoiador Dunga, e do zagueiro Ricardo Rocha, um grupo de atletas mais experientes que se autodenominava o grupo dos Dinos “dinossauros”. Esse grupo, do qual, por incrível que pareça, até o normalmente individualista Romário participava, respondia pelos jogadores para a mídia, negociava qualquer problema com a cúpula da CBF, trocava ideias com Parreira sobre a armação do time e dos adversários. Sempre respeitando a hierarquia e fazendo-se respeitar pelo currículo.

Essa relação honesta em que cada um sabia seu lugar facilitou o trabalho de Parreira de mostrar a esse grupo o que mostra a esse grupo o que mostra a todos: o fato de que, em cada grupo existem os que pensam e os que fazem força.

“Num espetáculo, existem a música, o solista e também o funcionário que carrega o piano para o palco. E todos são fundamentais, sem qualquer um deles, o show não acontece.”

Assim, no grupo de 1994, Bebeto e Romário eram os solistas no script da seleção, enquanto Dunga e Mauro Silva eram chamados de carregadores de piano, auxiliados por Mazinho, Zinho e Raí. E ninguém se sentiu diminuído ou se achou mais do que os companheiros. Deu no que deu.

Eduardo Pimentel

Técnico de Futebol

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