Nunca fui Santo - Ex-goleiro palmeirense Marcos revê sua carreira - SóEsporte
Especiais

Nunca fui Santo – Ex-goleiro palmeirense Marcos revê sua carreira

Nunca fui Santo

Ex-goleiro palmeirense Marcos revê sua carreira em depoimento inédito ao jornalista Mauro Beting, em lançamento da editora Universo dos Livros

Em 16 de maio de 1992, o Palmeiras vence o Guaratinguetá por 4 a 0 num amistoso. Um jovem goleiro de 19 anos se ajoelha, ergue os dedos apontando para o céu e agradece a Deus. Nascia um ritual embaixo das traves ao mesmo tempo em que o futebol brasileiro via nascer um dos melhores arqueiros de todos os tempos. Seu nome, Marcos Roberto Silveira Reis, ou grandiosamente “Marcão”, que realizava o sonho de jogar pelo Palmeiras, ser o número 12 e o número 1 da história recente do clube alviverde.

De lá pra cá foram 532 jogos defendendo a camisa alviverde, alternando momentos de herói e vilão, às vezes num mesmo jogo. Mas que deixou, por trás das glórias e das decepções, um legado de garra, orgulho, lealdade, experiência, inspiração, raça e otimismo. Sua história de vida, longe e fora dos gramados, ou debaixo das traves, entre a linha do gol e a pequena área, é conhecida agora em depoimento inédito ao jornalista Mauro Beting, no livro Nunca fui Santo, da editora Universo dos Livros.

“Não é só um dos melhores goleiros que vi, mas uma das melhores pessoas que existem pra defender nossas cores e credos. Foram 20 anos pulando os tantos quilos pra nos fazer pular de alegria e orgulho e ficar de joelhos, agradecendo por seus milagres palmeirenses e brasileiros, campeões estaduais, nacionais, continentais e mundiais”, elogia o palmeirense Mauro Beting, na introdução do livro.

Do interior de São Paulo à capital. Do seu time do coração ao oriente mais distante, Japão e Coréia do Sul, onde conquistou o pentacampeonato mundial pela seleção brasileira, em 2002.  “Não dava pra eu jogar na frente, fui recuado pro meio. Depois pra zaga. Daí…”, lembra o goleiro. Vinte anos de carreira depois e muitas boladas, foram vários triunfos de um esportista que manteve a humildade, soube “baixar a bola e não se achar” e conquistou a admiração até de torcedores dos times rivais.

Nunca fui Santo é uma declaracão de amor ao Palmeiras, time que sempre admirou e torceu, contrariando o pai corinthiano. São causos engraçados dos bastidores do verdão e da seleção, contadas com o seu jeitão caipira e bem-humorado, dentre os quais o famoso pênalti defendido de Marcelinho Carioca, na semifinal da Libertadores, em 1999. Uma partida que lhe rendeu a “canonização”, e a partir de então suas defesas milagrosas seriam seguidas pelos locutores de rádio e televisão com um sonoro e vibrante São Marcos.

Em mais uma demonstração de amor ao clube, Marcos recusou uma proposta para defender o time inglês Arsenal para continuar comandando o Palmeiras na segunda divisão do Campeonato Brasileiro de 2003. “Quebraria a perna pra ser campeão da Série B. Aquele campeonato valia mais do que a Copa do Mundo de 2002”. Na condição de líder do time, mandou seu recado aos que  não quiseram continuar em 2003 para jogar a “Segundona” – “Esses estão na minha lista negra. Opa, quer dizer, na lista verde”.

Como não só de lances espetaculares vive o goleiro, Marcos relembra as falhas e as decepções – bola largada que originou o gol de Keane na final do Mundial Interclubes contra o Manchester United e a derrota para Boca Juniors na Libertadores de 2001.

Em Nunca fui Santo, Marcos revela os bastidores da concentração e o aprendizado com seus técnicos, em especial Felipão e Luxemburgo, e os treinadores de goleiros Carlos Pracidelli e Valdir de Moraes. E não deixa de lado o carinho que nutre pelos colegas de time e adversários, como Vampeta, e os goleiros e ídolos Velloso, Sérgio (que lhe ajudou muito no primeiro ano de clube) e seus reservas na seleção, Rogério Ceni e Dida.

Em 14 de janeiro de 2012, Marcos pendurou as luvas. Foram 532 partidas pelo Palmeiras. “Umas 510 pra lembrar e, pra falar a verdade, umas 10 pra esquecer.”, ressalta. As dores e o sentimento de não conseguir mais repetir as atuações dos anos anteriores, sem a mesma agilidade e reflexo, o fez abandonar a pequena área. O ídolo deixou os treinos e o gostinho de pisar em campo com milhares de torcedores gritando o seu nome em uníssono para se dedicar à clínica São Marcos – um centro de reabilitação e fisioterapia pra pessoas comuns e também pra profissionais sem condições financeiras. A família palmeirense, que lhe concedeu o título de embaixador do clube, sempre continuará no seu coração. Como ele mesmo ironiza, “não uso black-tie, só verde-tie.”

Trechos do livro Nunca fui Santo:

“O pessoal lá de trás é sempre o vilão. Não importa que o ataque não marcou, que o meio-campo não pegou na intermediária. A culpa será nossa. Precisamos defender a nossa meta e nos defender fora de campo também”.

“Uma honra? Uma roubada! Vai que eu entro só para a disputa e não cato nenhum pênalti? Quem seria o responsável pela derrota? Eu! Naquela época, não tinha esse cartaz todo. Era apenas o reserva de um grande goleiro como o Velloso. Eu já tinha sido chamado para a Seleção pelo Zagallo, em 1996, depois de 18 jogos como titular. Fui reserva do Zetti em Brasil 3 x 1 Lituânia, em Teresina, em outubro. Mas só isso. Quando o Velloso se recuperara da lesão, voltara a ser o número um. Com toda razão e merecimento. Embora eu tentasse cavar uma brecha, né? A gente costumava dividir o quarto em concentração. Eu sempre deixava o ar condicionado no máximo para ver se ele pagava uma gripe para então eu poder jogar. E o Velloso nem espirro dava! Eu tive de parar com a brincadeira por que achei que iria sobrar uma pneumonia pra mim.”

“Um dia a gente estava junto, no segundo andar do prédio onde morava, lá na Lapa. Tinha um cara empurrando um Monza. Estava garoando. Chamei o Zezinho para ajudar a empurrar o carro que parecia quebrado. O cara agradeceu quando o carro pegou no tranco e disse “obrigado, fica com Deus!”. A gente estava voltando para o apê quando chegou um cara correndo, dobrando a esquina: “Vocês viram um Monza passar aqui? É o meu carro que foi roubado!”.

Eu sempre tive bons reflexos: “Monza? Aqui? Não vi, não”.

Como eu ia falar pro cara que tinha ajudado a empurrar o carro dele que estava sendo furtado? Como eu iria saber que o cara que pedia ajuda era um ladrão?

Pelo menos era um ladrão bem educado que mandou a gente ficar com Deus.”

Ficha Técnica

Livro: Nunca fui Santo

Autores: Marcos Reis e Mauro Beting

Editora: Universo dos Livros

Nº de págs.: 168

Preço: R$ 39,90

Clique para comentar

Deixe um Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.