Criada longe da mãe, apenas com o pai e os irmãos, Emily Priscila, de 12 anos, tem um sonho: ajudar a família. Como ainda é bem jovem, a estudante não pode trabalhar. Mas isso não a impediu de buscar uma alternativa: o esporte. Aluna da Rede Municipal de Ensino, ela descobriu na prática do xadrez a oportunidade de uma nova vida.
“Conheci o xadrez e não larguei mais. Até a minha família aprendeu a jogar, para eu poder treinar em casa. Diariamente, aprendo novas técnicas e sei que o caminho é extenso, mas de uma coisa tenho certeza: serei uma enxadrista profissional”, disse. Atual campeã dos Jogos Escolares da Paraíba, Emily, aluna do 7º ano da escola Celso Furtado, no Conjunto João Paulo II, falou com convicção.
A unidade de ensino é uma das 78 escolas municipais que desenvolve o projeto Xadrez Escolar, executado pela Prefeitura de João Pessoa (PMJP), por meio da Secretaria de Educação e Cultura (Sedec). Nesse projeto, os alunos do Ensino Fundamental (1º ao 4º ano) têm atividades em sala de aula enquanto os do Fundamental II (5º ao 9º ano) seguem com aulas no contra turno.
Em sua escola, Emily atua auxiliando a professora, distribuindo os conjuntos com os tabuleiros e as peças, para que os próprios alunos montem e comecem o jogo. Nesse ambiente, crianças e adolescentes não desperdiçam um instante sequer de tempo e se dedicam com gosto à prática.
“É incrível como o xadrez é bem aceito. Todos adoram a atividade. Quando a turma se reúne para jogar, por mais difícil que seja, acabam-se as conversas paralelas e o local se transforma”, afirmou a pedagoga Enizeuda Gomes.
Gracilane de Souza, 15 anos, é uma das que não perdem uma aula. Depois que começou a praticar a atividade, melhorou o desenvolvimento cognitivo e a autoestima. “Acabo de ganhar o duelo. Isso é mágico para uma enxadrista. E o mais legal, quando acho que já sei tudo, vejo uma situação nova e aí tenho que colocar a mente pra funcionar”, contou a estudante do 4º ano, que tem deficiência mental leve e atrofia muscular.
Ferramenta de inclusão – Para o secretário de Educação, Luiz Júnior, o xadrez é uma ótima ferramenta de inclusão, já que desenvolve as potencialidades dos alunos e faz com que eles superem cada vez mais os próprios limites, respondendo a uma das preocupações fundamentais do ensino moderno: dar a possibilidade de cada aluno progredir segundo seu próprio ritmo, valorizando, assim, sua motivação pessoal.
Na escola José Eugênio Lins, no Bairro do Ernesto Geisel, a atividade segue em ritmo acelerado. Quando a campainha sinaliza o início da aula, os estudantes demonstram satisfação em poder se divertir com responsabilidade. Aprendendo a aceitar o ponto de vista dos colegas e a limitar sua própria liberdade em favor dos outros.
“O jogo mostra as consequências de atitudes displicentes, que não tenham sido previamente calculadas e, por conseguinte, estimula o hábito de refletir antes de agir. Na prática, quando posicionamos uma peça em um lugar errado, dificilmente vencemos o duelo”, explica Jean Carlos, de 10 anos, que já escolheu seu presente do Dia das Crianças: um jogo de xadrez.
A mãe, Taís Kaline, que é auxiliar de serviços na unidade de ensino, disse que vai presentear o filho com maior prazer. “Depois que Jean começou essa atividade, seu comportamento é outro. Ele passa horas treinando no ambiente escolar e, não satisfeito, quer fazer o mesmo em casa”, comemorou a mãe.
As amigas Andreza Maria e Gabriela Patrício se concentram para mais uma disputa de conhecimento e força mental. Brigas, nem pensar, pois vence quem tiver mais autocontrole. “É muito bom participar desse jogo, que proporciona não apenas uma opção de lazer, mas a possibilidade de valorizar o raciocínio com o exercício mental”, disse Andreza.
Esporte pedagógico – Até a garotada do 1º ano, que ainda está aprendendo a ler, já começa a se arriscar nas primeiras jogadas. “Já aprendemos os valores de cada peça e a álgebra do tabuleiro, agora é colocar o peão pra andar e fazer as capturas”, brincou a estudante de 7 anos Adriele Gomes.
“A idéia de levar o xadrez até as escolas reside no fato de ele ser um esporte pedagógico, que auxilia no desenvolvimento das demais disciplinas curriculares. O desenvolvimento do raciocínio é fundamental para que a cidadania se efetive, por isso é importante o xadrez como complemento à educação escolar”, explicou a professora Jacinta Maria.
Xadrez escolar – Considerado uma ótima matéria para ser aplicada na escola, o segundo esporte mais praticado no mundo é um grande impulsionador da imaginação, que também contribui para o desenvolvimento da memória, da capacidade de concentração e da velocidade de raciocínio. Além de desempenhar um importante papel socializante, por ensinar a lidar com a derrota e com a vitória, o xadrez mostra que nem a derrota é sinônimo de fracasso nem a vitória quer dizer sucesso.
O aprendizado e a prática do xadrez desenvolvem as seguintes habilidades: atenção e concentração; julgamento e planejamento; imaginação e antecipação; memória; vontade de vencer, paciência e autocontrole; espírito de decisão e coragem; lógica matemática, raciocínio analítico e sintético; criatividade; inteligência; organização metódica do estudo; e interesse pelas línguas estrangeiras.
Competições – Durante o ano letivo, são realizadas diversas atividades com o alunado. Desde competições, como as Olimpíadas Escolares Municipais, a simultâneas, nas quais um jogador desafia (ao mesmo tempo) vários outros. A idéia é incentivar os estudantes e descobrir novos talentos que possam representar a cidade em eventos estaduais e nacionais.
O coordenador do projeto, Francisco Cavalcanti, enfatizou que a PMJP investe no jogo de xadrez não apenas em sala de aula, mas também em eventos extraclasse, com ações em praças públicas, Estação Cabo Branco, orla e Parque Solon de Lucena, e premiações que vão de medalhas e troféus a computadores. “Isso mostra o compromisso da gestão para com a melhoria da qualidade de ensino, por meio do incentivo a uma atividade lúdica que, além de jogo, tem muito de arte e ciência”, disse o secretário.